Emenda inserida em projeto de lei dá suporte a 70 mil técnicos judiciários, de nível médio, para reivindicar equiparação aos salários dos analistas de nível superior
Anajus Notícias
10/04/2022
Um “trem-bala da alegria” ameaça provocar um rombo bilionário nos cofres públicos da União. Trata-se do projeto de lei 3662/2021, aprovado na semana passada na Câmara dos Deputados, com uma emenda que altera a escolaridade dos técnicos de nível médio do Poder Judiciário da União (PJU), passando a exigir deles nível superior nos próximos concursos públicos. A matéria seguiu para o Senado.
Se aprovado no Senado, sem alterações, e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro, a matéria dará suporte para que os 70 mil atuais ocupantes dos cargos de nível médio passem a exigir equiparação salarial com os 40 mil Analistas Judiciários, de nível superior, sem precisar fazer novo concurso público. Isso poderá ocorrer por meio de pressões como greve e via ações judiciais de indenização.
A Anajus, única entidade nacional exclusiva dos Analistas do Judiciário e do Ministério Público da União, fez levantamento sobre os efeitos de emenda estranha ao texto colocada na votação do texto, em manobra conhecida como ‘jabuti’, de autoria da deputada Érika Kokay (PT-DF). Essa emenda eleva a escolaridade para ingresso na carreira de técnicos, fechando as portas do Judiciário a milhões de cidadãos que só possuem nível médio, diz a entidade. Isso porque, segundo o IBGE (2019), apenas 17,5% da população tem nível superior completo.
Isso poderá provocar aos cofres públicos um custo adicional de, no mínimo, R$ 340 milhões por mês, ou o equivalente a quase R$ 4,4 bilhões ao ano. È quase a metade dos gastos feitos pelo governo federal para o enfretamento da covid-19 nos dois primeiros meses de 2022.
O levantamento toma por base apenas os valores iniciais dos vencimentos das duas carreiras, respectivamente, R$ 7.591,37 (nível médio) e R$ 12.455,30 (nível superior). O gasto inclui pensionistas e aposentados. A diferença entre as categorias é de 64%, o equivalente a R$ 4.863,93.
O PL é de autoria do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), cujo texto original tem o apoio da entidade por ampliar o quadro de analistas na instituição. Serão usados 4 cargos de auxiliar judiciário e 192 cargos de técnico judiciário para a criação de 118 cargos da carreira de analista judiciário, todos do quadro permanente da Corte. Mas,a relatora da matéria, deputada Celina Leão (PP-DF),aprovou a emenda de Érika Kokay, desvirtuando a proposta.
Para o advogado Bruno Borges, da assessoria jurídica da entidade, é óbvio que, se o PL virar lei, o técnico entrará com ação judicial de indenização por desvio de função, quando faz atividade de analista e se reconhece a escolaridade dele como de analista.
A indenização para quem ocupa cargo mais elevado por desvio de função está prevista na Súmula 378 do Superior Tribunal de Justiça (STJ): “O servidor público que desempenha funções alheias ao cargo para o qual foi originariamente provido, em virtude de desvio funcional, faz jus ao pagamento das diferenças salariais correspondente a esse período, sob pena de locupletamento indevido por parte da Administração”.
“Isso é motivo para milhares de ações contra a União por desvio de função, e o próprio Legislativo reconheceu”, afirma o advogado. “E aí para onde vai o Judiciário? Qual o impacto orçamentário? Isso vai resultar em todo o ressarcimento quinquenal, fora as gratificações e outros benefícios. Não dá pra pagar essa conta”.
Para o presidente da Anajus, Walfredo Carneiro, os juízes que analisaram as ações podem conceder direitos aos servidores além do prazo prescricional de cinco anos. “O servidor pode também pedir o direito de ganhar igual aos analistas desde que ingressou no tribunal. Se o juiz mandar pagar, o Estado vai ter que pagar ou recorrer”, comentou.
Segundo Walfredo Carneiro, a categoria dos analistas será valorizada com a apreciação de projeto da Lei de Organização da Carreira de Analista Judiciário (Lorcan). Entre outras novidades, a matéria transforma o cargo em carreira típica Estado, assegurando estabilidade aos servidores, e permite que os bacharéis em direito possam advogar em causas não conflitantes com as instituições em que trabalham. Além disso, equipara os vencimentos aos servidores do Ciclo de Gestão do Executivo, cujos salários são mais elevados em 50%.