Governo enviou PEC ao Congresso Nacional. Para José Celso Cardoso Júnior, do IPEA, ‘a proposta é um choquezinho liberal dos anos 1990’
Carta Capital
15/09/2020
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) encaminhada pelo governo ao Congresso na quinta-feira 3, da reforma administrativa, poderia ser chamada também de “ajuste fiscal, o retorno”. O motivo dessa dupla identidade é que a PEC visa quase que exclusivamente reduzir gastos correntes por meio da quebra da estabilidade funcional para fins de demissão, um expediente para rebaixar as remunerações dos atuais servidores e os salários das novas contratações, motivo de alguns a considerarem apenas, ou principalmente, um novo capítulo da política de austeridade fiscal permanente de Paulo Guedes.
Além de pôr em risco as condições fundamentais exigidas para o exercício das funções dos servidores ao extinguir a estabilidade, não responde à necessidade de aprimorar o serviço público, não reduz a burocracia nem enfrenta o autoritarismo crônico na relação entre os funcionários e o público. Tampouco reduz o custo da máquina do Estado, segundo especialistas. Não bastasse, contém mais uma excrescência governamental, a outorga de poderes arbitrários adicionais ao presidente da República por meio da inserção na Constituição de dispositivo que completa a submissão ao mercado, conforme se esclarecerá adiante.
A republicanização e a redemocratização do Estado deveriam ser os eixos de qualquer reforma que se pretenda fazer, defende José Celso Cardoso Júnior, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e presidente da Associação Nacional de Funcionários da instituição.
A reforma atual é, no entanto, “uma perfumaria, um choquezinho de gestão da linha gerencialista liberal dos anos 1990, que obviamente não vai melhorar em nada o desempenho, a relação do Estado com a sociedade nem alargar as possibilidades de cobertura das políticas sociais, nem diminuir desigualdade nenhuma, pelo contrário, vai aumentar. A proposta em essência é retirar o Estado das políticas públicas e tornar o servidor mais vulnerável para cumprir as missões institucionais das organizações que foram criadas ou fortalecidas da Constituição de 1988 para cá”, analisa.
O fim da estabilidade é a derrubada da última muralha de proteção do funcionário contra o assédio institucional caracterizado, segundo associações profissionais do setor, por recorrentes ameaças, cerceamentos, constrangimentos, desautorizações, desqualificações e deslegitimações do trabalho do servidor público e que se tornou a forma dominante de relacionamento entre distintas instâncias ou organizações hierárquicas em cada poder da União e entre chefias e subordinados. Um comportamento de várias autoridades liderado pelo próprio presidente da República, quando persegue o funcionário do Ibama que o multou por pesca ilegal em 2012 em Angra dos Reis, e provoca a demissão do presidente do Inpe, Ricardo Galvão, no ano passado, por ter cumprido com a sua obrigação funcional de retratar as queimadas na Amazônia, entre inúmeros exemplos.
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