A PEC prevê que os cargos em comissão e as funções de confiança serão substituídos por apadrinhados de políticos
ADUNESP
28/10/2022
No dia seguinte ao primeiro turno das eleições de 2022, já conhecido o perfil conservador e de direita da maioria dos eleitos e eleitas para o Congresso Nacional, o presidente da Câmara Federal, deputado reeleito Arthur Lira (PP/AL), apressou-se em dizer que é hora de trazer à tona a proposta de emenda constitucional (PEC 32/2020), que prevê a Reforma Administrativa, paralisada desde o final de 2021 por conta da forte reação do conjunto do funcionalismo público.
Os resultados do segundo turno das eleições, que definirão o próximo presidente da República e governadores em vários estados, como é o caso de São Paulo, têm tudo a ver com esta questão. A depender do que saia das urnas, Lira e a maioria hostil aos serviços públicos no Congresso, seja no atual ou no próximo mandato, terão carta branca para tentar aprovar a PEC 32. O ministro Paulo Guedes, da Economia, por sua vez, poderá colocar em marcha o achatamento do salário mínimo e das aposentadorias (veja matéria no Boletim do Fórum das Seis). Bolsonaro e Tarcísio, respectivamente candidatos do PL ao governo federal e do Republicamos ao paulista, são fiadores destas propostas.
PEC 32 – Um rosário de maldades
Como bem assinalou a economista Maria Lúcia Fatorelli, em entrevista ao jornal Extra Classe (16/6/2021), “não se trata de uma reforma administrativa, mas, sim, da maior alteração já feita à Constituição brasileira, cujo objetivo é destruir a estrutura do Estado brasileiro em todos os níveis – federal, estadual e municipal – e abrir espaço para a privatização e a terceirização generalizadas, pondo fim aos serviços públicos gratuitos e universais prestados à população”.
Vejamos algumas razões que justificam a análise da economista.
A farsa dos altos salários
Um dos principais argumentos usados pelos defensores da PEC 32 é o de que a reforma administrativa acabaria com “privilégios” no serviço público, como é o caso dos “altos salários”. O argumento é falso.
Estudo divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) mostra que o Brasil conta com 10,3 milhões de empregos no setor público. Destes, 55% estão nos municípios, 28% nos estados, 9% no setor federal e 8% nas chamadas ‘empresas estatais’. Profissionais de saúde e educação ocupam 39,8% dos vínculos. A maioria (53,1%) ganha até quatro salários mínimos (SM). Salários acima de 20 SM somam somente 3,2%.
Vale lembrar que a PEC 32 não inclui juízes, parlamentares, membros do Ministério Público e das carreiras militares.
Privatização dos serviços públicos: Ataque direto à população
Com a inclusão do Artigo 37-A na Constituição, conforme previsto na proposta, a União, os estados e os municípios poderão executar seus serviços por “cooperação com órgãos privados”. Isso significa que serviços públicos de saúde, educação, assistência e outros poderão ser entregues a empresas privadas, acabando com os concursos públicos. Também poderiam ser contratados temporários, sem carreiras e sem uma série de direitos.
Além de precarizar as relações de trabalho, a medida afetará diretamente a população, pois os serviços passariam a ser geridos por empresas privadas, que têm no lucro o objetivo principal.
Fim da estabilidade e retirada de direitos
Um dos pontos sensíveis da PEC 32 é o fim da estabilidade para quase todas as carreiras. Segundo o texto que tramita no Congresso, haverá cinco novos tipos de vínculos para os/as novos/as funcionários/as públicos/as e apenas servidores/as de carreiras típicas de Estado (Saúde, Educação, por exemplo, não se incluem) poderão manter a estabilidade. Para todos/as, atuais e futuros/as, há a possibilidade de demissão por avaliação de desempenho, seja lá o que isso significaria.
O fim da estabilidade é um ataque direto à garantia constitucional que permite ao/à servidor/a público/a trabalhar sem pressões políticas. E é falso dizer que o/a servidor/a é “intocável”, pois o serviço público tem regras de avaliação e punição, garantindo o amplo direto à defesa.
Com a Reforma, ficam proibidos os seguintes direitos aos servidores: férias em período superior a trinta dias; adicionais por tempo de serviço; aumento de remuneração ou de parcelas indenizatórias com efeitos retroativos; licença-prêmio, licença-assiduidade ou outra licença decorrente de tempo de serviço; progressão ou promoção baseadas exclusivamente em tempo de serviço.
Espaço para apadrinhamento e corrupção
Haverá alterações também na ocupação de cargos pelos atuais servidores. A PEC prevê que os cargos em comissão e as funções de confiança serão progressivamente substituídos pelos cargos de ‘liderança e assessoramento’, que poderão ser indicados diretamente por ato do chefe de cada Poder em cada ente (União, estados, DF e municípios).
Aposentados/as também na mira
Com a progressiva extinção de carreiras, trocadas pela terceirização e contratos temporários, os/as atuais aposentados/as perderão a paridade com o reajuste dos/as ativos/as; os institutos de previdência, que pagam suas aposentadorias, terão déficits devido à ausência de novos/as servidores/as, o que autorizará os governos a aumentarem as alíquotas de contribuição.
Olho no segundo turno. Olho na luta
O resultado do segundo turno das eleições tem relação direta com o desfecho desta grave ameaça que significa a PEC 32: aos serviços públicos, à sociedade que deles necessita e aos/às servidores/as públicos/as que os concretizam.
Para além das urnas, sabemos que a luta continua sendo o caminho para barrar a reforma administrativa e quaisquer ataques que sejam disparados contra a classe trabalhadora e a maioria pobre da população do país. Novos capítulos desta história ainda serão escritos.