O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) firmaram nesta terça-feira (30/6) duas parcerias para ampliar o potencial da mediação e conciliação na solução de conflitos e para simplificar o acesso de advogados a processos judiciais movidos em todos os tribunais do país.
Agência CNJ de Notícias
30/06/2020
A primeira iniciativa conjunta tem por objetivo lançar um curso a distância nacional para capacitar advogados como conciliadores e mediadores. A segunda parceria vai tornar a OAB protagonista no desenvolvimento do Escritório Digital, solução tecnológica que oferece ao advogado uma porta de entrada única para todos os processos em que atue, independentemente do tribunal e do sistema de tramitação eletrônica de processos.
Ao assinar o termo de compromisso para disseminar a capacitação para advogados, o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, destacou a importância da capacitação para o fortalecimento da Política Nacional de Conciliação, que em 2020 completa 10 anos. “Um dos eixos dessa política é a capacitação de profissionais para as funções de mediador e de conciliador. A formação dos agentes do Sistema de Justiça no uso das ferramentas consensuais é uma etapa chave na superação da cultura do litígio e na instituição da cultura da pacificação”, afirmou o ministro, durante a solenidade de assinatura das parcerias, transmitida por videoconferência do Plenário do CNJ, em Brasília.
A Política Judiciária Nacional de Tratamento Consensual de Conflitos foi instituída pela Resolução CNJ nº 125, em 2010. A norma prevê que sejam estabelecidas parcerias com entidades públicas e privadas para formar conciliadores e mediadores. O curso terá carga horária de 40 horas e fornecerá aos advogados os fundamentos teóricos previstos na norma. A capacitação os habilitará a acompanhar e orientar seus clientes em sessões de conciliação e mediação. O conteúdo dos módulos teórico e específico será cedido pelo CNJ à Escola Superior Nacional de Advocacia. Serão abertas 500 vagas por semestre. A parceria tem duração de um ano, prorrogáveis por um prazo máximo de cinco anos.
De acordo com o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, a participação da advocacia e fundamental na disseminação pedagógica da conciliação como alternativa à judicialização excessiva dos conflitos. “Não há conciliação sem mudança cultural profunda no nosso modelo de litígio sem esse trabalho pedagógico, sem a participação da advocacia.”
Corregedoria
O ministro Humberto Martins lembrou que a corregedoria nacional de Justiça também tem sido uma importante parceira nessa busca de alternativas facilitadoras de solução de conflitos, citando, como exemplo, a edição do Provimento nº 67/2018, que disciplinou a realização de serviços de conciliação e mediação em cartórios extrajudiciais.
Para o corregedor, esses importantes avanços, como a edição do provimento e a assinatura do Termo de Cooperação Técnica, são frutos de uma mudança de comportamento dos agentes da Justiça, dos operadores do direito e da sociedade para superar a tendência – ainda majoritária – da judicialização dos conflitos de interesse.
“Eu posso atestar com segurança que este Termo de Cooperação Técnica vem ao encontro da modernidade e dos interesses da cidadania, na medida em que pretende estender, agora, a formação de conciliadores e mediadores aos advogados. Com este termo de convênio, ganham a Ordem dos Advogados e o Judiciário brasileiro, que o firmam, mas principalmente ganha o cidadão que será diretamente beneficiado.”
Pilotos
Os cursos começarão em dois tribunais, que servirão como polos-pilotos da iniciativa: o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). O presidente do TJPE, desembargador Fernando Cerqueira, ressaltou o sucesso da prática da conciliação no estado, apesar da pandemia da Covid-19 ter prejudicado acordos presenciais. “Estamos com ótimos números de conciliações realizadas por WhatsApp e videoconferência, além de disponibilizarmos a conciliação para empresas e empresários em dificuldade em decorrência da pandemia.”
Até 19 de junho, foram realizadas 3.720 audiências com 1.611 acordos pelo Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (NUPEMEC) do TJ em todo o estado. De acordo com o presidente da corte, 43% das audiências no período resultaram em acordos que resolveram conflitos no valor de R$ 28,8 milhões.
De acordo com o presidente do TJSP, desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco, por causa da pandemia, a justiça paulista tem recebido conflitos em fase pré-processual por e-mail e realizado sessões de conciliação por videoconferência. O presidente do Judiciário do estado com o maior número de casos de Covid-19 e o maior número de processos judiciais em tramitação entre os tribunais brasileiros vislumbra um aumento significativo da procura pelos serviços da Justiça em função dos conflitos gerados pela pandemia. “A crise vem atingindo a esfera jurídica, nas relações de consumo, no direito de família, direito empresarial, entre outros. A pandemia certamente intensificará a busca pelo Judiciário, que tem de estar preparado para responder tempestiva e adequadamente a essas demandas.”
Oportunidade
O idealizador do curso e conselheiro do CNJ, Henrique Ávila, destacou o momento oportuno da conciliação nessa época de pandemia, “em que crise financeira e social demandará muito do Poder Judiciário, em função do crescimento da judicialização”. De acordo com o conselheiro, que é presidente da Comissão Permanente de Solução Adequada de Conflitos do CNJ, o papel dos advogados na resolução dos conflitos é fundamental. “O advogado é o primeiro juiz de qualquer causa, pois define qual o caminho, qual método a ser adotado naquela causa em particular, se a judicialização ou se a conciliação.”
Diretor-geral da Escola Superior Nacional de Advocacia, o advogado Ronnie Duarte destacou a urgência da superação dos obstáculos impostos à conciliação pelo desconhecimento da prática. “A iniciativa representa um vetor para a potencial mudança cultural há muito ansiada pelos operadores do Sistema de Justiça.”
O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Marco Aurélio Buzzi, exaltou a trajetória do Movimento pela Conciliação, do qual participa desde sua criação, em 2006, pela então presidente do CNJ, ministra Ellen Gracie, e celebrou o desempenho de algumas unidades judiciais no exercício da conciliação. “No Fórum João Mendes, em São Paulo, por exemplo, mensalmente são resolvidos na porta de entrada da Justiça de 28 a 33% de todos os processos da área cível. Nos mutirões de conciliação, conseguimos índices de até 98% de conciliação.”
Escritório Digital
O segundo termo de cooperação técnica firmado nesta terça-feira (30/6) entre CNJ e OAB prevê a expansão do Escritório Digital, sob a governança da OAB. A partir de agora, o Conselho Federal da Ordem ficará responsável por receber petições e emitir seus respectivos protocolos, com garantia de segurança. O CNJ apoiará os tribunais a disponibilizarem o acesso a seus sistemas de tramitação eletrônica de processos ao Portal do Escritório Digital.
Lançado em 2015, pelo então presidente do CNJ, ministro Ricardo Lewandowski, o software permite que um advogado acesse em um só lugar virtual todos os processos que tenha ajuizado, seja em um Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal, na Justiça Eleitoral, do Trabalho ou Militar, ou ainda em algum dos conselhos superiores. Com qualquer dispositivo que acesse internet à mão – computador, tablet ou celular –, o advogado poderá peticionar, ajuizar nova demanda, receber intimações, controlar prazos e compartilhar informações de processos no mesmo ambiente virtual.
Segundo o presidente do STF e do CNJ, ministro Dias Toffoli, a tecnologia desenvolvida pelo Conselho em parceria com a OAB é importante para consolidar a Justiça como um sistema integrado. Além disso, o Escritório Digital contribuirá para os serviços prestados pela advocacia, função essencial à Justiça e defensora da democracia e das liberdades fundamentais. “Em uma sociedade digital, em constante transformação, a concretização da justiça passa não só pelo resguardo aos direitos em si, mas também pela forma como eles se processam no Judiciário”, afirmou.
De acordo com o presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz, tornar essa solução tecnológica mais amigável aos advogados brasileiros é uma missão desafiadora, semelhante à da adoção do Processo Judicial Eletrônico (PJe), na década passada. À época presidente da OAB-RJ, Santa Cruz recorda o “trauma que foi treinar advocacia para se adaptar à adoção do PJe”. “Foi fundamental para estarmos hoje aqui trabalhando. Para expandir o Escritório Digital precisaremos de coragem e da capacidade técnica. Temos de apostar não em um passado idílico que não existiu, mas no futuro. E a tecnologia é chave para isso”, disse.
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